há no correr das horas um abismo só meu.
aqui me estendo, de pés presos ao chão
e mãos cheias de sonhos.
lá em cima na distância, onde só o meu olhar pousa,
espraia-se fogo e vida e som,
mas aqui no abismo sou eu e o silêncio tardio.
pudera eu ser mais leve que a minha fadiga
e levaria estes sonhos tristes à liberdade da existência.
mas neste abismo no correr das horas
tenho menos de mim do que o que sou,
menos que o silêncio ido e voltado,
menos que vida.
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terça-feira, 2 de julho de 2019
quarta-feira, 29 de agosto de 2018
gémea da minha alma
os anos correram e eu não.
esqueci-te, larguei as mágoas e amarras,
fechei os olhos ao tempo e ao sentir.
seria assim simples
- como suspiro profundo -
e não teria mais de te ver, irmã,
gémea da minha alma.
mas apenas deambulei cega,
de tropeção em queda,
e o meu corpo insensível e magoado
fingia não sentir.
fui enganada pelas palavras,
as que disse de mansinho,
sem que desse conta,
e julguei ser livre do que era
do que fui
do que sou.
e agora,
de olhos abertos e sonhos de dor,
descubro que as amarras cá estão,
que de mágoas estou cheia,
que nunca deixaste a minha beira, irmã,
gémea da minha alma.
esqueci-te, larguei as mágoas e amarras,
fechei os olhos ao tempo e ao sentir.
seria assim simples
- como suspiro profundo -
e não teria mais de te ver, irmã,
gémea da minha alma.
mas apenas deambulei cega,
de tropeção em queda,
e o meu corpo insensível e magoado
fingia não sentir.
fui enganada pelas palavras,
as que disse de mansinho,
sem que desse conta,
e julguei ser livre do que era
do que fui
do que sou.
e agora,
de olhos abertos e sonhos de dor,
descubro que as amarras cá estão,
que de mágoas estou cheia,
que nunca deixaste a minha beira, irmã,
gémea da minha alma.
sábado, 5 de novembro de 2016
tanto
já carregaste tanto
por tanto tempo
já foste tudo e tiveste nada.
e agora és chamada por quem não vejo.
talvez a verdade esteja nas palavras
que não dizes, ou talvez
nas que não lembras.
é uma viagem que fazes só,
a mais longa
a mais lenta
a mais longínqua.
para mim, que carrego as tuas mágoas,
a mais dolorosa.
esquece, que eu lembro
enquanto souber lembrar.
nas mentiras que já são honestas
disfarço a saudade.
já carregaste tanto.
foste o mundo.
agora é tarde;
carrega apenas as lembranças,
as que te fazem menina.
é tão tarde;
dá-me o teu braço
(sei que não gostas)
e vamos. eu leio-te.
já foste o mundo.
eu sou o resto.
por tanto tempo
já foste tudo e tiveste nada.
e agora és chamada por quem não vejo.
talvez a verdade esteja nas palavras
que não dizes, ou talvez
nas que não lembras.
é uma viagem que fazes só,
a mais longa
a mais lenta
a mais longínqua.
para mim, que carrego as tuas mágoas,
a mais dolorosa.
esquece, que eu lembro
enquanto souber lembrar.
nas mentiras que já são honestas
disfarço a saudade.
já carregaste tanto.
foste o mundo.
agora é tarde;
carrega apenas as lembranças,
as que te fazem menina.
é tão tarde;
dá-me o teu braço
(sei que não gostas)
e vamos. eu leio-te.
já foste o mundo.
eu sou o resto.
terça-feira, 10 de julho de 2012
amarras
preciso de uma realidade forte e suave
de gestos com palavras que me toquem
me prendam
me soltem
de desejos, não de sonhos
de mãos que me sustenham aqui
não me larguem para o céu
mas eu sei ser sozinha
e as amarras que preciso
prendo-as eu
por ora
(não chegam)
01.07.2012
de gestos com palavras que me toquem
me prendam
me soltem
de desejos, não de sonhos
de mãos que me sustenham aqui
não me larguem para o céu
mas eu sei ser sozinha
e as amarras que preciso
prendo-as eu
por ora
(não chegam)
01.07.2012
quarta-feira, 9 de maio de 2012
não estás aqui
há todos os espaços que precisam de ser cheios
e as palavras que não chegam nem lhes tocam
nos vazios onde cresce a noite
e nas horas quando se evaporam desejos
e não encontram voz em sussurros
quando os gritos são ecos
serás és foste foras
nunca serias ou agora
os olhos fechados ao quarto desenham clausuras
mas já não estás aqui
por que não estás aqui?
é a tua mão que oiço nos dias escuros
estendo a minha
e perdi-te.
por que não estás aqui?
e as palavras que não chegam nem lhes tocam
nos vazios onde cresce a noite
e nas horas quando se evaporam desejos
e não encontram voz em sussurros
quando os gritos são ecos
serás és foste foras
nunca serias ou agora
os olhos fechados ao quarto desenham clausuras
mas já não estás aqui
por que não estás aqui?
é a tua mão que oiço nos dias escuros
estendo a minha
e perdi-te.
por que não estás aqui?
domingo, 4 de março de 2012
esta vida é uma morte lenta
esta vida é uma morte lenta
de indiferença em indiferença
até uma apatia maior
abulia da alma com o corpo.
esta vida é um crepúsculo
sei-o bem de cinzentos
cores do meu coração
cores do âmago do mundo.
esta vida, como todas, é não sentir.
é fenecer como as flores
e perder todos os modos de amar
enquanto os anos são nossos.
esta vida é um espelho sem nós
que não há lugar para ser
nesta vida que não nos tem.
esta vida é um abismo e
nada.
de indiferença em indiferença
até uma apatia maior
abulia da alma com o corpo.
esta vida é um crepúsculo
sei-o bem de cinzentos
cores do meu coração
cores do âmago do mundo.
esta vida, como todas, é não sentir.
é fenecer como as flores
e perder todos os modos de amar
enquanto os anos são nossos.
esta vida é um espelho sem nós
que não há lugar para ser
nesta vida que não nos tem.
esta vida é um abismo e
nada.
sábado, 11 de fevereiro de 2012
pedem-me palavras
pedem-me palavras que não tenho
e sorrisos que perdi
quando era de todas as cores e o dia
era meu.
as palavras - talvez nunca as tenha tido
- eram trejeito a solavancos de vivências
e bálsamos para maleitas de espírito.
os sorrisos, esses, deixei-os pela estrada
com as flores que nunca colhi.
guardá-las-ei para quando todas as cores forem minhas e
o dia for meu
de novo
e sorrisos que perdi
quando era de todas as cores e o dia
era meu.
as palavras - talvez nunca as tenha tido
- eram trejeito a solavancos de vivências
e bálsamos para maleitas de espírito.
os sorrisos, esses, deixei-os pela estrada
com as flores que nunca colhi.
guardá-las-ei para quando todas as cores forem minhas e
o dia for meu
de novo
segunda-feira, 30 de janeiro de 2012
esperas à minha beira
esperas à minha beira
sentada de mãos no regaço
enquanto perco os trilhos pelas faces
e o silêncio pela dor.
de olhos carregados observas
a ruína que me toma, e eu não sei
-nunca soube-
mais que desfazer-me em tuas mãos
uma e outra vez
com soluços que me arrancam a alma
não sorris.
desconheço o prazer que tomas em destruir-me assim,
sem palavras ou gestos ou existência
sem humanidade maior que a minha.
não há mais que isto, menos, é igual ser e
não ser será o limite da ignomínia,
antes caíssem as pontes e eu
sempre eu
ficaria aqui, sentada à tua beira
mas dói, dói tanto
até te cansares e partires
por hoje.
sentada de mãos no regaço
enquanto perco os trilhos pelas faces
e o silêncio pela dor.
de olhos carregados observas
a ruína que me toma, e eu não sei
-nunca soube-
mais que desfazer-me em tuas mãos
uma e outra vez
com soluços que me arrancam a alma
não sorris.
desconheço o prazer que tomas em destruir-me assim,
sem palavras ou gestos ou existência
sem humanidade maior que a minha.
não há mais que isto, menos, é igual ser e
não ser será o limite da ignomínia,
antes caíssem as pontes e eu
sempre eu
ficaria aqui, sentada à tua beira
até te cansares e partires
por hoje.
domingo, 27 de novembro de 2011
sereia
afundei todos os barcos sem que soubesses,
marinheiro,
que é ida a hora em que te poderias salvar.
apaguei os traços dos navios,
em mastros partidos afiei as garras,
em lemes tomei comando de profundezas
soubesses, marinheiro, que minha voz é outra!
que palavras são rasgos em sangue
que são lascas cravadas de barcos perecidos
e arrastados ao nunca por mim
soubesses, marinheiro, que minto.
que não te digo o que falta e
sou eu
mas não sabes, pobre marinheiro,
que nesse embalo que sentes,
entoado pelo meu mundo de trevas ondulantes,
chegará teu fim dorido,
olvidando-te a alma que tomei como minha
e não saberás, meu tesouro,
mais que o toque árido e gelado
das águas que são minhas,
para sempre
marinheiro,
que é ida a hora em que te poderias salvar.
apaguei os traços dos navios,
em mastros partidos afiei as garras,
em lemes tomei comando de profundezas
soubesses, marinheiro, que minha voz é outra!
que palavras são rasgos em sangue
que são lascas cravadas de barcos perecidos
e arrastados ao nunca por mim
soubesses, marinheiro, que minto.
que não te digo o que falta e
sou eu
mas não sabes, pobre marinheiro,
que nesse embalo que sentes,
entoado pelo meu mundo de trevas ondulantes,
chegará teu fim dorido,
olvidando-te a alma que tomei como minha
e não saberás, meu tesouro,
mais que o toque árido e gelado
das águas que são minhas,
para sempre
quinta-feira, 30 de junho de 2011
Não chega.
não chega.
como chegaria se é uma imensidão pequena
cheia de coisas de nada?
não toca o fundo e alcança o nada
e nunca chega.
não chega.
não doira as bordas da indomável,
não pinta os sonhos ou orna as cores.
pequena insignificante incompreensível.
dorido rasto de soberba e imaculada arrogância,
nos instantes arrastados e mudos.
não chega.
não!
pois se não tem querer ou vida!
não, não chega!
o que resta de sobras do que satisfez o moroso tempo
é um resquício irascível que fenece sem horas.
não chegou.
como chegaria se é uma imensidão pequena
cheia de coisas de nada?
não toca o fundo e alcança o nada
e nunca chega.
não chega.
não doira as bordas da indomável,
não pinta os sonhos ou orna as cores.
pequena insignificante incompreensível.
dorido rasto de soberba e imaculada arrogância,
nos instantes arrastados e mudos.
não chega.
não!
pois se não tem querer ou vida!
não, não chega!
o que resta de sobras do que satisfez o moroso tempo
é um resquício irascível que fenece sem horas.
não chegou.
domingo, 10 de abril de 2011
quebraram-se as pontes
o lápis traça as linhas em que me oculto
neste céu de pétalas de glicínia vetusta,
nestas cores pálidas de amanhecer.
é um infinito em que o mundo não escorrega
e o tempo passa como se não passasse.
há nas letras mais vida e nas formas mais ser
e as palavras não doem. e eu não
sou.
as pontes quebraram-se e
shh, é a hora eterna do silêncio,
parceiro de cartas até ao final
da noite sem fim
(aqui onde me deixo)
quebraram-se as pontes e
as letras são minhas.
novamente.
neste céu de pétalas de glicínia vetusta,
nestas cores pálidas de amanhecer.
é um infinito em que o mundo não escorrega
e o tempo passa como se não passasse.
há nas letras mais vida e nas formas mais ser
e as palavras não doem. e eu não
sou.
as pontes quebraram-se e
shh, é a hora eterna do silêncio,
parceiro de cartas até ao final
da noite sem fim
(aqui onde me deixo)
quebraram-se as pontes e
as letras são minhas.
novamente.
quinta-feira, 18 de novembro de 2010
chega-me a alma.
perco a caneta mas chega-me a alma.
chega para lavrar o que quero com a tinta do que me desejam.
chega-me, então, para alcançar a noite com o sorriso que guardo,
enrodilhado em recados que tocam todos o âmago
(naquele enrodilhado heterogéneo de saudades)
e é sempre cedo demais, mas chega.
chega para salvar as tristezas para amanhã, é só mais um dia,
hoje é mais um dia, são todos dias iguais mas hoje, sim, hoje,
é diferente.
mais uma vez, antes de ires, e a emoção é mais que inesperada,
falta tão pouco, já está, já foi.
foi mas ficou, que a alma que me chega, na calma antes da tempestade que sou,
guarda o sorriso e os obrigados, nunca gastos de tanto repetidos.
obrigada.
chega para lavrar o que quero com a tinta do que me desejam.
chega-me, então, para alcançar a noite com o sorriso que guardo,
enrodilhado em recados que tocam todos o âmago
(naquele enrodilhado heterogéneo de saudades)
e é sempre cedo demais, mas chega.
chega para salvar as tristezas para amanhã, é só mais um dia,
hoje é mais um dia, são todos dias iguais mas hoje, sim, hoje,
é diferente.
mais uma vez, antes de ires, e a emoção é mais que inesperada,
falta tão pouco, já está, já foi.
foi mas ficou, que a alma que me chega, na calma antes da tempestade que sou,
guarda o sorriso e os obrigados, nunca gastos de tanto repetidos.
obrigada.
terça-feira, 19 de outubro de 2010
dorme bem, noite.
fora, lá fora, cheira a serra e a noite.
cá dentro há a tranquilidade doce em que se esconde o ensandecer tardio,
moribundo soberano, déspota intemporal perdido em ruídos vãos.
mas no quarto cansado em que correm as trevas pela luz quebrada,
é pela janela que entra a monotonia serena e sem soberba do dormir do dia,
é pela janela que se evade a noite da rua e vem, suave, leve e ternamente, a mim.
dorme comigo, noite! dorme esse sono que sentes em omnipresença, dorme comigo.
e em ti, enquanto esquecemos o resto e me entras pela janela e foges do mundo,
nos lençóis da minha infância, na cama desfeita de indolência ociosa,
passamos pelo abraço eterno do cansaço perfeito.
dorme bem, noite.
cá dentro há a tranquilidade doce em que se esconde o ensandecer tardio,
moribundo soberano, déspota intemporal perdido em ruídos vãos.
mas no quarto cansado em que correm as trevas pela luz quebrada,
é pela janela que entra a monotonia serena e sem soberba do dormir do dia,
é pela janela que se evade a noite da rua e vem, suave, leve e ternamente, a mim.
dorme comigo, noite! dorme esse sono que sentes em omnipresença, dorme comigo.
e em ti, enquanto esquecemos o resto e me entras pela janela e foges do mundo,
nos lençóis da minha infância, na cama desfeita de indolência ociosa,
passamos pelo abraço eterno do cansaço perfeito.
dorme bem, noite.
domingo, 19 de setembro de 2010
Nostalgia
faltam-me aqui, no calor escorreito e leve, as gargalhadas roucas da tua alma
e os bocejos que tocam os fins das manhãs, do tamanho do teu imenso sorriso.
e todas as discussões são estradas de paciência mal calcorreadas, perdendo-se
enquanto chegamos a lado nenhum entre palavras acesas de teimosia.
outros te diziam o mesmo, a ti que és quem me lembro de não ter,
que guardavas os actos para a gentileza e a acidez para os discursos virulentos,
que aquecias de amor ou frustração com tua impetuosa voz, mas nunca foste tu de ouvir,
ou eu, que é de família esta surdez, memória bem-amada e contraditória, pejada de saudades.
e, não te vendo, sabe que estás entre as alegrias e és lembrado com tanto carinho que dói,
e que a árvore que podaste cresce de ano para ano, mais alta e imponente que nunca.
e os bocejos que tocam os fins das manhãs, do tamanho do teu imenso sorriso.
e todas as discussões são estradas de paciência mal calcorreadas, perdendo-se
enquanto chegamos a lado nenhum entre palavras acesas de teimosia.
outros te diziam o mesmo, a ti que és quem me lembro de não ter,
que guardavas os actos para a gentileza e a acidez para os discursos virulentos,
que aquecias de amor ou frustração com tua impetuosa voz, mas nunca foste tu de ouvir,
ou eu, que é de família esta surdez, memória bem-amada e contraditória, pejada de saudades.
e, não te vendo, sabe que estás entre as alegrias e és lembrado com tanto carinho que dói,
e que a árvore que podaste cresce de ano para ano, mais alta e imponente que nunca.
quarta-feira, 14 de julho de 2010
lá fora
lá fora.
entre os candeeiros acesos para matar as estrelas
e as janelas corridas para não entrar a noite
lá fora.
onde estão os crepúsculos e amanheceres
e o sol e a lua giram pelo fim, exauridos
lá fora.
imersos no vento que é sopro de frestas,
feito de suspiros de vozes embaladas
lá fora.
no lugar onde os acordes de músicas perfeitas
arrancam notas de jubilosa tristeza
lá fora.
lá fora estão todos os caminhos e lá fora perdi-te,
era doce de viagens de casa em casa, sussurros de brisas,
carícias, pecados, sonhos desconhecidos da derradeira.
como pode o mundo ficar para trás quando o carregas no peito?
lá fora é a serventia do silêncio obliterante,
do rodar das engrenagens que te amam a alma.
se a tens.
lá fora perdes o dom da nostalgia pelo da melancolia
e a todas as horas os dedos gastam-se pelo dedilhar de pianos sós.
ao longo dos passos caminha a sombra dos dias felizes,
lá fora.
[ao biscoito]
entre os candeeiros acesos para matar as estrelas
e as janelas corridas para não entrar a noite
lá fora.
onde estão os crepúsculos e amanheceres
e o sol e a lua giram pelo fim, exauridos
lá fora.
imersos no vento que é sopro de frestas,
feito de suspiros de vozes embaladas
lá fora.
no lugar onde os acordes de músicas perfeitas
arrancam notas de jubilosa tristeza
lá fora.
lá fora estão todos os caminhos e lá fora perdi-te,
era doce de viagens de casa em casa, sussurros de brisas,
carícias, pecados, sonhos desconhecidos da derradeira.
como pode o mundo ficar para trás quando o carregas no peito?
lá fora é a serventia do silêncio obliterante,
do rodar das engrenagens que te amam a alma.
se a tens.
lá fora perdes o dom da nostalgia pelo da melancolia
e a todas as horas os dedos gastam-se pelo dedilhar de pianos sós.
ao longo dos passos caminha a sombra dos dias felizes,
lá fora.
[ao biscoito]
quarta-feira, 26 de maio de 2010
as cores do mundo
se o mundo tem cores não as vejo,
lavadas pela chuva do amanhã
que te embebeda os sentidos.
tudo é abulia inglória, singela apatia
feita da morta 'sprança,
e o sono dos justos foi em tempos,
agora é dos que ousaram sonhar.
"amar" é palavra vã, pois como se ama
se tudo é o mesmo e é impossível amar tudo?
já não temos idade para lágrimas ou
nuvens cerradas no bolso para dar,
e as apoteoses da ciência tocam outros
que não nós.
caí na repetição
caímos na repetição
caiu o mundo na repetição
e cheira a monotonia,
cheira ao mesmo e ao sempre
com golfadas de inusitado.
quando te afastares para casa hoje
será a última vez
até amanhã.
lavadas pela chuva do amanhã
que te embebeda os sentidos.
tudo é abulia inglória, singela apatia
feita da morta 'sprança,
e o sono dos justos foi em tempos,
agora é dos que ousaram sonhar.
"amar" é palavra vã, pois como se ama
se tudo é o mesmo e é impossível amar tudo?
já não temos idade para lágrimas ou
nuvens cerradas no bolso para dar,
e as apoteoses da ciência tocam outros
que não nós.
caí na repetição
caímos na repetição
caiu o mundo na repetição
e cheira a monotonia,
cheira ao mesmo e ao sempre
com golfadas de inusitado.
quando te afastares para casa hoje
será a última vez
até amanhã.
sexta-feira, 7 de maio de 2010
do ponto onde te encontras
do ponto onde te encontras vês a borda do mundo,
estendes os dedos e vences a manhã com carícias pagãs.
cresce o dia, vai tarde a vontade, agora, nem todas as vezes
é repouso o sonhar que fazes.
fosse toda a música feita de ti, como a fazes,
e nascerias da abulia que esgrimes como arma de sopro.
sopro, pois que todos os ventos são resquícios de memórias,
e as noites apagam-se com a facilidade de velas murchas.
é desta! toca, sente, ergue a face e roça as nuvens que te aspiram,
milagres antecipados e feitos da erva que te acorda o caminho
durante a manhã que venceste com carícias pagãs.
sê heresia.
sê o cantar mais inocente que a ponta da tua caneta alcançar
e suspira confissões escondidas; ninguém tas saiba que te votam ufano,
vendendor de almas a troco de ingenuidade.
os pecados, sentidos como beijos contraditórios,
são somente papéis banhados no rio de versos perdidos,
lavados da cor pelo ondular do tempo.
estendes os dedos e vences a manhã com carícias pagãs.
cresce o dia, vai tarde a vontade, agora, nem todas as vezes
é repouso o sonhar que fazes.
fosse toda a música feita de ti, como a fazes,
e nascerias da abulia que esgrimes como arma de sopro.
sopro, pois que todos os ventos são resquícios de memórias,
e as noites apagam-se com a facilidade de velas murchas.
é desta! toca, sente, ergue a face e roça as nuvens que te aspiram,
milagres antecipados e feitos da erva que te acorda o caminho
durante a manhã que venceste com carícias pagãs.
sê heresia.
sê o cantar mais inocente que a ponta da tua caneta alcançar
e suspira confissões escondidas; ninguém tas saiba que te votam ufano,
vendendor de almas a troco de ingenuidade.
os pecados, sentidos como beijos contraditórios,
são somente papéis banhados no rio de versos perdidos,
lavados da cor pelo ondular do tempo.
sábado, 10 de abril de 2010
Preciso.
preciso de respostas imediatas como o ricochete dos sonhos no mundo,
bruscas, tão bruscas que me tiram o fôlego.
não quero viver na pressa dos segundos, mas as horas são lentas em demasia,
as mais das vezes.
preciso de hipérboles de cor para equacionar as minhas interjeições,
que cobertas não fazem sentido.
preciso do que não dou por egoísmo, quisesse a vida ser justa e
precisaria mais ainda do que posso.
preciso, neste querer imediato e feroz, de todos os sorrisos do mundo,
que os meus não chegam.
quantos me sobrarem usá-los-ei, um diferente cada dia,
que os dias são diferentes para mudar os sorrisos.
dá-me das pedras que escorregam de baixo dos pés,
dá-mas com a chuva na primavera tardia, quando roça o estio,
e não há roupa que cubra as peles secas e aradas.
preciso de esquecer os que me sabem e de olvidar a vida para viver;
la mémoire m'effraie quand je me sens seule et les larmes demandent mon foyer.
bruscas, tão bruscas que me tiram o fôlego.
não quero viver na pressa dos segundos, mas as horas são lentas em demasia,
as mais das vezes.
preciso de hipérboles de cor para equacionar as minhas interjeições,
que cobertas não fazem sentido.
preciso do que não dou por egoísmo, quisesse a vida ser justa e
precisaria mais ainda do que posso.
preciso, neste querer imediato e feroz, de todos os sorrisos do mundo,
que os meus não chegam.
quantos me sobrarem usá-los-ei, um diferente cada dia,
que os dias são diferentes para mudar os sorrisos.
dá-me das pedras que escorregam de baixo dos pés,
dá-mas com a chuva na primavera tardia, quando roça o estio,
e não há roupa que cubra as peles secas e aradas.
preciso de esquecer os que me sabem e de olvidar a vida para viver;
la mémoire m'effraie quand je me sens seule et les larmes demandent mon foyer.
quinta-feira, 18 de março de 2010
há dias assim.
hoje a chuva cheirou a chuva.
tirei o riso do âmago e ri, e o riso cresceu na rua larga
sob o plúmbleo céu de quase-primavera.
a chuva que cheirava a chuva, num riscar do limiar das estações,
roçou-me a pele como quem roça o sonho,
num entre-suspiro de aroma a infinito. cheirou-me a chuva
sobre o betão salpicado, naqueles segundos feitos para o mundo.
a sorte crescia-me na língua e o dia fugia de mim, pautado pelos rasgos
de sentido de sintonia com as horas.
foge o dia o tempo as cores, resta o cinzento vivo do céu choroso
e a luz morta do quarto, com paz, que paz, agora que se escoa a sorte da língua.
porque há dias assim, de terna alegria contida no viver,
dias em que a chuva cheira a chuva.
tirei o riso do âmago e ri, e o riso cresceu na rua larga
sob o plúmbleo céu de quase-primavera.
a chuva que cheirava a chuva, num riscar do limiar das estações,
roçou-me a pele como quem roça o sonho,
num entre-suspiro de aroma a infinito. cheirou-me a chuva
sobre o betão salpicado, naqueles segundos feitos para o mundo.
a sorte crescia-me na língua e o dia fugia de mim, pautado pelos rasgos
de sentido de sintonia com as horas.
foge o dia o tempo as cores, resta o cinzento vivo do céu choroso
e a luz morta do quarto, com paz, que paz, agora que se escoa a sorte da língua.
porque há dias assim, de terna alegria contida no viver,
dias em que a chuva cheira a chuva.
terça-feira, 16 de março de 2010
já gastámos mais que os passos
já gastámos mais que os passos, roemos as palavras, mastigadas no veludo das horas
quando cai a noite. estropiámos o crepúsculo, entre nós; quero culpar-te e saber que
não fui eu a razão. encontrámos a dor na noite, nos olhos vermelhos - antes de choro, que o choro
consola-se.
secam-se as lágrimas, mas a tristeza não esquece. pois que arrependimento este, que tédio supremo,
que desregrado tempo que passou. se fosse um lustro, diria que foi de mais. que nessa noite se rasgaram as últimas amarras,
vogou então o navio das indolentes distâncias, longe no longe é longínquo, perdido, esquecido. não te lembres,
que por mim a lembrança mata. recordar o olvidado é blasfémia, heresia punível com dor, quem a traz sobre ti
és tu.
terias reaberto a ferida se soubesses, inocente nessa tua crença vã? ou a coragem é-te sinónimo de astúcia, e fugir da mágoa é
caminho sereno coberto de luz? luz que nunca procuraste, se não noutros com dias mais cinzentos.
de espelhos são feitas as lágrimas, que te tocam de ti como tu, carícias cálidas correndo contentes, e tu triste, que é da justiça do mundo?
quanto te tocam as palavras gastas na noite, na manhã, madrugada dentro, acompanhadas por música que assim,
nessa voz, nesse corpo, não tem mais significado?
os passos, esses, morreram quebrados, porque nunca foram afinal importantes [ou importaram em demasia]
vaidade, que se perde então? todas as vidas foram minhas, as sílabas rolaram destroçadas,
carpi os dias passados que esqueceste — oh, por que os esqueceste?
por que deixaste para trás tanto, por que ganhaste tão pouco? e se tudo isto fosse mais que um sonho,
um pesadelo mal vivido que não previsse já ao arrumar-te em gaveta cerrada, então mais seriam as lágrimas,
as dores, os prantos corroídos. assim é melhor, suave, chocada e doloridamente, mas sem mais que desilusão.
e eu que queria tanto crescer contigo, eu que era vã na minha descrença escatológica, porque nada
nada tem um fim, mas tudo acaba por fenecer antes de a eternidade chegar.
espera por mim!, grito, mas quê, são palavras, lembro-me, palavras que já gastámos e que me morreram nas mãos.
morte, que trágica, tiras-me o mundo, e afinal, não é preciso morrer para se estar perdido. não quando
os elos são trucidados com a infâmia que cometes, porque nem sequer terias direito a um poema, um poema que escrevo com as palavras que gastámos.
ou talvez tenha sido eu a usá-las, tantas e tantas vezes que lhes arranquei o significado. os passos cansaram o caminho
e nunca mais o tomo, não os mesmos, quero agora trilhos diferentes para outros fins mais belos.
agora que gastámos tudo, que resta? se nem o olhar se sustém porque tenho medo,
medo de quê?
medo de mudança, e agora mudei outra vez, mudaste, se mais tu ou eu não importa, não me percebes.
se acreditasse que fora esta a última vez para mim, sorriria, que os sorrisos são feitos para o fim, para limpar as lágrimas
abrindo covas para escoar as mágoas aquosas.
e cada vez destoa menos, a indiferença que me cobre, mascarada de irritação. quanto mais, mais fácil,
menos doloroso,
e gastarei menos palavras, porque no fim não servirão nem para
viver.
quando cai a noite. estropiámos o crepúsculo, entre nós; quero culpar-te e saber que
não fui eu a razão. encontrámos a dor na noite, nos olhos vermelhos - antes de choro, que o choro
consola-se.
secam-se as lágrimas, mas a tristeza não esquece. pois que arrependimento este, que tédio supremo,
que desregrado tempo que passou. se fosse um lustro, diria que foi de mais. que nessa noite se rasgaram as últimas amarras,
vogou então o navio das indolentes distâncias, longe no longe é longínquo, perdido, esquecido. não te lembres,
que por mim a lembrança mata. recordar o olvidado é blasfémia, heresia punível com dor, quem a traz sobre ti
és tu.
terias reaberto a ferida se soubesses, inocente nessa tua crença vã? ou a coragem é-te sinónimo de astúcia, e fugir da mágoa é
caminho sereno coberto de luz? luz que nunca procuraste, se não noutros com dias mais cinzentos.
de espelhos são feitas as lágrimas, que te tocam de ti como tu, carícias cálidas correndo contentes, e tu triste, que é da justiça do mundo?
quanto te tocam as palavras gastas na noite, na manhã, madrugada dentro, acompanhadas por música que assim,
nessa voz, nesse corpo, não tem mais significado?
os passos, esses, morreram quebrados, porque nunca foram afinal importantes [ou importaram em demasia]
vaidade, que se perde então? todas as vidas foram minhas, as sílabas rolaram destroçadas,
carpi os dias passados que esqueceste — oh, por que os esqueceste?
por que deixaste para trás tanto, por que ganhaste tão pouco? e se tudo isto fosse mais que um sonho,
um pesadelo mal vivido que não previsse já ao arrumar-te em gaveta cerrada, então mais seriam as lágrimas,
as dores, os prantos corroídos. assim é melhor, suave, chocada e doloridamente, mas sem mais que desilusão.
e eu que queria tanto crescer contigo, eu que era vã na minha descrença escatológica, porque nada
nada tem um fim, mas tudo acaba por fenecer antes de a eternidade chegar.
espera por mim!, grito, mas quê, são palavras, lembro-me, palavras que já gastámos e que me morreram nas mãos.
morte, que trágica, tiras-me o mundo, e afinal, não é preciso morrer para se estar perdido. não quando
os elos são trucidados com a infâmia que cometes, porque nem sequer terias direito a um poema, um poema que escrevo com as palavras que gastámos.
ou talvez tenha sido eu a usá-las, tantas e tantas vezes que lhes arranquei o significado. os passos cansaram o caminho
e nunca mais o tomo, não os mesmos, quero agora trilhos diferentes para outros fins mais belos.
agora que gastámos tudo, que resta? se nem o olhar se sustém porque tenho medo,
medo de quê?
medo de mudança, e agora mudei outra vez, mudaste, se mais tu ou eu não importa, não me percebes.
se acreditasse que fora esta a última vez para mim, sorriria, que os sorrisos são feitos para o fim, para limpar as lágrimas
abrindo covas para escoar as mágoas aquosas.
e cada vez destoa menos, a indiferença que me cobre, mascarada de irritação. quanto mais, mais fácil,
menos doloroso,
e gastarei menos palavras, porque no fim não servirão nem para
viver.
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