sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

Há palavras que nunca te disse.

Há palavras que nunca te disse.
Palavras, apanágio meu, que são meros percalços,
soluços gastos que a vida me trouxe. Não precisam de ser ditas,
sabe-las sem as ouvir, que as vozes distorcem as almas.

Palavras sem cor, do monótono e opaco branco
que nem sempre se esvai, daquele que é feito da minha indiferença.
São rastos fecundos da nostalgia que me fende, no silêncio triste
da noite a caminho da solene e leda madrugada.

Há palavras feitas de mel.
Meigas, tecidos brocados de saudades, de tempos, de sonhos,
sabem a lágrimas doces tingidas pelo riso, retinindo em cores
que fazem esquecer o doloroso do mundo que nos retém.

Foram quiçá palavras que senti, quebradas pelo não-dizer,
enforcadas pela torrente que morre ao sair;
não digo, não sinto, não sou.
Pois que não seja, de nada serviria ser se as palavras,

pecados revoltos de jamais serem tocados,
são obscuros enleios que nos ancoram à dor,
ao medo de as dizer, de as não proferir, que flutuam na ansiedade
que ao longe recheia as vozes. Dizer, não dizer.

E nas palavras que não te digo —
que nada devemos ter nas mãos
e as palavras são mais que nada,
nas mãos, nos olhos, na boca, —

suspiro os mundos que sonho e crio,
sem nunca tos dizer porque creio, talvez sem fim,
que o silêncio te sabe dizer as palavras que não te digo,
as palavras que nunca te disse.

terça-feira, 12 de janeiro de 2010

Mundo lacónico.

Lacónico seria o mundo se o julgasse,
se dos meus braços lhe jorrassem as cores,
se por entre os meus dedos esquecessem,
humanos mortais cansados,
que da vida há mais que sonhos, que dores,
que também seria vida se perdessem
soluços de riso, pousando-os no regaço,
qual flores decadentes que ousei amar.

Desídia desdenhosa tomaria o mundo,
mundo meu que me mentiu;
deixá-lo-ia de pobre, inábil, desdito,
mais cedo conspurcaria de véus o céu escuro
para que as estrelas dissessem que partiu
na distância, moribundo e constrito,
desfeito e feito eterno e exilado perjuro,
senhor um dia do que desejei não desejar.

De silente o clamo, sem desígnios falsos
que tolhem dos pés o chão, que sempre os há,
pejados da ignomínia falsa que é ser,
ser por não ser entre os outros como nós;
não me quedo neste quebranto, pois hora-má
foi aquela em que sonhei deixar de ver,
voltaria atrás agora, gritaria a rouca voz
que do que era nosso nada há a perdoar.

Não será, enfim, de ser humano, criatura insana,
que de o ser somente é opróbrio solene,
canção palmilhada e morta pelo vento da dor,
ansejo liquefeito de trevas pautadas pela alma
lavada de branco, que alvo é tom perene,
rasgada pela vida que a toca sem cor,
antes fosse do ébano que range na noite calma,
tremendo nos dentes-de-leão que sempre quis soprar.