segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

Insaciável.

boa vontade reside nos minutos contados
insolentes, que não te libertam do cansaço
somente te entretêm, pesadamente
contra a tua fome de liberdade
onde anseias bolos, com
inutilidade outra que não a de satisfazer apetites
teus. E não só.
ostentas a tua glória, incompleta.

e agora? combinados são
incumpridos, porque não há quem derrame
os tempos que correm, vagarosamente.
não se preocupam eles, fúteis!,
com nossos acordos mortais, aninhados
na distância.
vergonha, que não somos, jamais,
prometedores conscientes.
mas as palavras exigem a sua própria justiça,
pelo que nos resignamos a cumpri-las.




[Teimoso. Um não te chega?]

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

Acrósticos de Dor.

imortal vontade de anti-persistência
não sabes que teimas demasiado?
dói! pára, que me magoas
inimiga cruel, aliada traiçoeira
feres-me com tuas adagas de marfim, mas
estão manchadas a vermelho
recordas sangue.
então é assim que condenas os inocentes
nunca concedendo - desconheces a palavra - misericórdia.
tua vergonha banha as horas
eternamente.



(...)



ergues-te - déjà vu.
ganhas, perdes, no teu centro incontestado
ondulante e infame crença nas flores - e Echos
controlas (-te), e jamais houve tão bela demonstração de amor-próprio
escondes-te, sem te ocultares, na 'splendorosa luz do dia
nada há que não anseies, não é assim?
tomas em ti a tua singularidade
rasgas - numa miríade de pedaços -
infracções alheias
sumindo-te, depois, para os recônditos superficiais
morosamente afastados, por mim (ou por ti - que importa?)
onde não será, alguma vez, deserto corrido de paz.

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2008

Ritual Monotonia.

Sabes que hoje é igual.
Que hoje, o teu espreguiçar e enxotar o sono
é clone do ontem e do que foi antes porque tudo
é sempre o mesmo. Atiras-te de cabeça para os desfiladeiros
que, afinal, são estradas pejadas de viaturas; de cansados instrumentos
de condução ao inferno (monótono).
Sabes que hoje é igual.
Que não há simbólicas cores que quebrem o rotineiro cinzento
que se alastra em manchas agregadas por tons - mais escuros,
mais claros. A indecência de vivências conjuntas repetidas alastra
e há pouco a acrescentar ao que já é conhecido.
Os gritos que ouves são os mesmos de agora e de sempre,
ecos imaginados até à infinidade - serão os homens eternamente os mesmos?
Sabes que hoje é igual.
Mas rebelas-te contra a rotina, bates o pé, e afirmas, peremptoriamente:
Hoje não me apetece.


Para o Colinas.

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

Gritas!

É na expressão cansada de todos os rostos que te apercebes da tua felicidade. É no cair lento da tarde, que demora, e nos silêncios, que compreendes que, para ti, o dia passa depressa e nunca deixas de cantar.

«You shouldn’t have to jump for joy.»

É na rotina dos outros que desfazes a tua crença na monotonia dos teus dias, e compreendes que a saudade do passado é importante, mas que há coisas que te são dispensáveis.

«In violent times, you shouldn’t have to sell your soul.»

Gritas!, e o dia amanhece no horizonte, penetrando nas fendas e raiando de ofuscante luz os nichos de indiferença. Nunca careces de um abraço, ou de um sorriso, ou de um olhar atónito que te faz sorrir, ou soltar estridentes gargalhadas que ecoam por salas quase vazias e mãos discretas.

«If I could change your mind, I’d really love to break your heart.»

Não é preciso ostentares o desprezo que não sentes. Nem tardas a perceber que se eclipsam, parcialmente, as estrelas por detrás das nuvens – manchas no céu -, mas que nenhuma te faz falta por ser irrelevante ver para além de ti. Os mitos derretem-se por entre as percepções de que o real basta para as lições de moral que corrompem a ética que segues piamente.

Frases confusas que se entranham na memória e se tornam irónicas constatações da des-realidade.

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008

Distraído Doce.

correm os dedos pelas horas
com vislumbres de verde cambiante

aqui
ali

e admiro como convertes
- talvez seja incompreendida, a palavra -
gulodice
em ouvires de alimentar da chuva.

espalha-se a meninice
(em que teimas - como te atreves!)
pelos deslizares serpenteantes de
involuntária preguicite

que decorre da
gentileza.

e o olhar abstrai-se,
fitando redemoinhantes pontos
de nada dançante.

quando o mundo arde e o coração grita.

o castanho suaviza-se em súplicas
mas não as fazemos.
será orgulho?
ou vã teimosia que incorre em
pesares de palavras e mandar
- dormir, está na hora.

falta a compreensão das horas de silêncio.

[Obrigada.]

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008

O Vaguear da Lua pelo Despertar de Uma Cidade ou Viagem no 64

O chão-que-não-era-chão tremia sob seus pés, indiferente aos bocejos resmungados dos passageiros que lançavam olhares enublados pelo sono através das janelas embaciadas de respirações conjuntas. No exterior, o ar gelava os dedos, enquanto ele tentava discernir, serenamente, por entre a pré-madrugada. As notas que se elevavam sobre a cidade iludiam a escuridão adormecida, e nada mais havia no céu nocturno-matinal que a lanterna-farol ignorada, com os olhares postos no raiar da alva celestial em ardentes chamas de arco-íris.
E, nesse despertar de sensações ainda imersas no entorpecer dos sentidos pouco claros, embriagados pelo pudor de obrigações rotineiras, acreditava ser o único a olhar a brilhante e redonda lua. Com a clara nitidez da arrogância bem definida pela imaginação egocêntrica, mirava a invulnerável mas cansada donzela cercada pelos seus aposentos de ébano estrelado. E se fosse o único? E se todos os outros habitantes da ruidosa cidade tivessem os olhos pregados ao chão numa angústia de não querer olhar para cima, por ser demasiado alto? Ou se esperassem apenas o dealbar do dia, e fixassem o oriente com suas orbes semi-inconscientes, alçando a vista onde apenas esperava l’avenir? Talvez fosse, então, aquele a quem a lua retribuía o olhar ofuscante, pleno da sua angelicalidade demoníaca, pois a sua auréola hipnotizava o seu único espectador. Quando desaparecia por segundos, ocultada por detrás das construções de betão que irrompiam como cinzentas flores silvestres, não tardava a reaparecer, para deleitoso êxtase de seu mirone.
E os centros comerciais acordavam com a cidade, e a cidade eram os centros comerciais, com suas gigantescas áreas de consumo de indiferenças em troca de satisfações momentâneas. Na sua frente corriam os apressados e os atrasados e os que apenas o julgavam estar, bem como palmilhavam, a passo lento, os que se delongavam de propósito para tardar a chegar a seus destinos. Sim, faltava pouco para o dia se levantar de vez, apesar de já tarde, comparado com a fervilhante metrópole.
De facto, a prateada lua afastava-se cada vez mais, descendo no céu cada mais claro. A sua superfície dir-se-ia encanecida, e desvanecia-se, empalidecendo conforme os segundos a traspassavam qual lanças que não vertiam sangue. Ou talvez fosse ela que não pudesse sangrar.
Não era infelicidade o que o seu admirador sentia, devido à sua partida. Enquanto ela ali estivesse, não lhe era inevitável a separação. Estremecia – os solavancos interrompiam as conversas que escutava desatentamente, sem acreditar na veracidade das palavras ou nas músicas de quem não era preocupação a interrupção do silêncio colectivo.
A maré de passageiros sobe e desce, sem qualquer aparente ligação à lua nem destinos entrecruzados pela falta de coerência entre todos. E acontece ser a afluência de hipocondríacos que antecede o chegar, pelo que os atrasos são desculpáveis apenas por si. É chamado, esperado desesperadamente que esteja pronto.
Assim, numa despedida apressada da já semi-desaparecida lua, corre no frio da manhã, sob o céu, agora já de um azul resplandescente, interrompendo o suave roçagar da neblina que cobre as ervas daninhas dos trilhos que surgem na urbe.

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008

Ode à Teoria da Comunicação.

são harmoniosos os dias
em que a teoria não preenche as horas
de monotonia
e são práticos os segundos
de factos relevantes
significados e significantes
sem quereres-dizer
ou signos que desobedecem a convenções
plenas da teimosia infantil
inimaginada nas frias salas
com livros desbocados de introdução
ao estudo da arte da simplicidade.

as meias-horas são gastas em reiterações
quando cabeças sem corpo
são apresentadas em bandejas
destruindo o tremer nervoso
ou o re-voltar do relógio
onde o tempo não passa.
e as falhas são quebras de raciocínios
de emissores emotivos
e pseudo-gritos que acordam risos na cansada rotina.


[Às aulas de Teoria da Comunicação.]

terça-feira, 5 de fevereiro de 2008

Pesadelos e Metáforas.

Image Hosted by ImageShack.us


buscas a mercê definitiva do tempo
cantando a ti nos solarengos dias
e nas madrugadas asfixiantes
pejadas do sono de noites
cujos sonhos intranquilizam.

sonhos maus.

prenúncios de derrotas contra a
velhice ou
separações de inebriante dor
e choras nos sonhos
porque as lágrimas reais
secaram

para sempre (?)

suspiras – oh, quão doce!
- e a geada alastra pelos teus dedos
enquanto te esfumas em nevoeiro
ouvindo os gemidos tardios do despertar.
na forma etérea
(teus pés já não tocam o chão húmido,
enlameado)
miras o decapitado Orpheu e a sua lira estilhaçada
- metáforas de desespero.

mas tu não és sua Eurydice,
ou sequer o tenebroso Hades.